A exuberância da química das cores do Outono é realçada neste poema de Deolinda Domingues Alves, num notável exercício de contemplação: o laranja e o vermelho ("encarnado"), o negro e o roxo, o verde e o azul, o claro e o escuro, todas as tonalidades se conjugam para a Natureza ir revelando esta sua fase de transição, entre a "longa secura" do Verão e os dias frios do Inverno, que se aproxima sem piedade.
As vinhas e os pomares plenos de frutos, o cair da folha, a terra molhada, a celebração da vida neste aspecto particular do equinócio outonal, com a natureza a envelhecer e os belos entardeceres já a pedirem outros aconchegos.
Deolinda Domingues Alves termina este seu poema com uma nota nostálgica, ao referir-se à Natureza, que fica triste quando um poeta eventualmente deixa de estar entre nós.
OUTONO
Uma exuberância de cores
Estende-se p'la terra escura
Que já refrescou,
Após longa secura
O laranja e o encarnado
- As cores do entardecer.
E, com elas, se vestem as nuvens
Pr'a embalarem o sol poente
Quando vai adormecer
O contraste
E a mistura do claro e do escuro!...
O negro e o roxo
- As cores das muitas mágoas;
O matiz deleitoso,
Do verde e do azul das águas
No vale e na colina,
Cumprindo o ciclo da vida,
Vinhedos e pomares
Oferecem a delícia dos frutos
Com uma ternura divina!
E, num misto de oração
E de poesia bem sentida,
As árvores deixam cair
Lágrimas de madrugada
Pr'a celebrar o amor
Pela terra já humedecida
Com uma doação infinita
Vai-se revelando a Natureza,
Enquanto os poetas
Celebram a vida
Nos poemas que escrevem,
Repletos de singular beleza
Mas, se um poeta morre,
Invade-nos a nostalgia,
Fica triste a Natureza,
Chora, de saudade, a poesia!...
Deolinda Domingues Alves - Leiria
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