segunda-feira, 26 de agosto de 2013

INHAMBANE - Porto e Caminho de Ferro de Inhambane

Do "site" Caminhos de Ferro em Moçambique, transcrevemos a parte referente a Inhambane.
http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=747322

Inhambane teve, como se sabe, os primeiros contactos com os portugueses ao tempo da primeira viagem de Vasco de Gama à Índia, em 1498. Mais tarde, em 1527, por ali passaram os navegadores Cid Barbudo e Pedro Quaresma à procura dos náufragos da perdição das naus na costa do Natal e de modo especial do fidalgo D. Luis de Meneses.

Em 1552 aquí estiveram os sobreviventes do naufrágio do galeão «S. João», depois da trágica morte de D. Leonor de Sepúlveda, seu marido e filhos nas areias escaldantes da Manhiça. O que restou desse primitivo grupo de sobreviventes, aquí embarcou para a Ilha de Moçambique.

Em Inhambane desembarcou, em 1560, a primeira expedição missionária cristã na África oriental, chefiada pelo padre jesuita D. Gonçalo da Silveira, que levava por companheiro André Fernandes. O padre jesuita encontraria dois anos mais tarde a morte de mártir, por ordem do Monomotapa, a quem ele próprio havia convertido, pouco antes, ao cristianismo. Também não escapou Inhambane às investidas dos holandeses nos princípios do século XVII e às tentativas de ocupação no século XVIII.

Assim que soube da ocupação holandesa da baía de Lourenço Marques, em Janeiro de 1721, o vice-rei João Saldanha da Gama ordenou ao Governador de Moçambique que tudo fizesse para embaraçar o trato comercial que os holandeses faziam no porto de Inhambane. Por essa altura chegou António Cardim Fróis, e, com a sua vinda, as embarcações holandesas foram aos poucos abandonando de vez o Porto de Inhambane.

Cardim Fróis desenvolveu uma actividade espantosa. Historiadores sul africanos contemporâneos estão convencidos que as tentativas dos ocupantes holandeses do forte Delagoa, em Lourenço Marques, no sentido de atingirem as minas do Monomotapa, através deste porto, falharam porque os guias nativos, propositadamente os teriam conduzido por caminho errado, desviando-os sempre para o Sul.

Supõem eles que esse trabalho era feito a instigações dos portugueses de Inhambane, para quem tais guias trabalhavam. Nocentro dessa política de afastar os holandeses das minas de Monomotapa, situa-se o hábil Cardim Fróis que não descurou também da defesa do porto, pois foi ele quem mandou alí construir a primeira fortificação. Essa fortificação está hoje comletamente desaparecida.

Em 1752, quando Moçambique se separou do Governo da Índia, durante o vice-reinado do Marquês de Távora, Inhambane era um centro importante na costa de Moçambique. O comércio que se fazia era apreciável e na célebre carta de El-Rei D. José I, de 9 de Maio de 1761, consentia-se que fosse elevada à categoria de Vila, talvez para contrapôr às ambições holandesas.

O desenvolvimento que se seguiu foi porém notável, até que as casas dos moradores, que eram construidas precáriamente, deram origem a frequentes incêndios, o maior dos quais foi ocorrido em 1854, em que ardeu a Praça e muitas residências particulares.

A Vila foi-se, no entanto, recompondo lentamente do desastre. Nessa altura, para assegurar o comércio do interior e garantir as rotas marítimas, reconheceu-se as necessidades de se estabelecer no Bazaruto uma Feitoria e um Forte.

Já em 1850 o Major Pedroso Gamito, numa Memória sobre um sistema para as colónias portuguesas, dedicada ao visconde de Sá da Bandeira, expusera a necessidade da ocupação efectiva das ilhas do arquipélago de Bazaruto e ainda a da abertura de uma estrada de Sofala a Inhambane.

Sá da Bandeira promoveu, depois, em 1855, através do Governador-geral de Moçambique, o envio de uma expedição para ocupar as ilhas. Foi comandante dessa expedição, Duarte Manuel da Fonseca.

Assim se criou a feitoria e foi instalada a Praça na ilha «Marcha» ou «Xinguine», que, em homenagem à esposa do governador, passou a denominar-se de Santa Carolina; a Praça teve o nome do Governador-geral Vasco Guedes de Carvalho e Meneses e a feitoria levou o nome de «Estabelecimento D. Pedro V». Para este estabelecimento vieram de Moçambique alguns colonos nativos, quase todos mestres de oficinas, que iniciaram as construções.

A construção de um Caminho de Ferro de via reduzida que ligasse Inhambane com Inharrime e, depois, se prolongasse até ao Chicomo, passando o rio numa ponte e chegando até ao Chibuto, foi pensamento de Mouzinho de Albuquerque, quando Comissário Régio. Era uma obra - escreveu - «em que fundava mais esperanças para desenvolver o distrito». Defendia ele o princípio de que a verdadeira via de penetração para Gaza deveria ser, no futuro, por Inhambane a Inharrime, atendendo às más condições da barra de Inhampura.

Foi Mouzinho que mandou estudar a primeira parte dessa linha (de Inhambane a Inharrime), trabalho que confiou ao tenente de engenharia Albino Gonzaga e o resultado desse estudo foi muito animador quanto ao preço da obra.

Conseguiu ainda em Lisboa que fosse apresentado e votado pelo Parlamento um projecto de lei autorizando um empréstimo de 450.000$00 réis, em ouro, para a construção desse caminho de ferro, o que se conseguiu por intermédio do deputado coronel Baracho. Escreveu Mouzinho: «Na minha ignorância das coisas políticas e trâmites parlamentares, julgava que esse projecto de lei apresentado pelo Governo não teria dificuldade em passar. Não sucedeu isso e foi preciso que um deputado, o coronel Baracho, se empenhasse muito com os seus colegas da maioria para que o projecto fosse votado».

Isso aconteceu, porém, pouco antes de Mouzinho deixar, em Julho de 1898, a seu pedido e bastante magoado, o Governo da Província de Moçambique. Depois que ele saiu de Moçambique, o projecto do Caminho de Ferro de Inhambane a Inharrime caiu por terra.

O mais estranho é que não se encontra vestígio do estudo feito pelo tenente Gonzaga respeitante ao traçado do caminho de ferro de Inhambane a Inharrime, nem o engenheiro Lisboa de Lima o conseguiu descobrir, no seu tempo, quando foi encarregado desses estudos. Costa Serrão também procurou e nada encontrou em correspondência relativa ao assunto. Mas existe o depoimento do próprio Mouzinho no seu livro Moçambique em que deixa transparecer a sua mágoa por não ter podido realizar mais este empreendimento.

O desejo do Governo Central em promover o desenvolvimento imediato dos distritos pacificados de Gaza e Inhambane evidencia-se com a publicação do decreto com a data de 27 de Novembro de 1902, no sentido da construção de uma linha eléctrica ou a vapor de Lourenço marques a Inhambane, via Marracuene, Manhiça, Xai-Xai (antigo João Belo), Inharrime e Inhambane. Tratava-se, pois, de um plano ainda mais audacioso que o de Mouzinho.

Publicado o decreto, decorreram porém dois anos, primeiro que, com a data de 5 de Agosto de 1904, desse entrada um requerimento em que Álvaro de Amorim Borges e Ernest Foot (mais tarde substituido por John Makenna) pediam a concessão, ao abrigo do mesmo decreto, de uma «linha de carros eléctricos», tanto para passageiros como para carga, a começar em Lourenço Marques e a findar no Xai-Xai (antigamente escrevia-se Chai-Chai), seguindo por Marracuene, Lagoa Pati até Xai-Xai. Nesse requerimento pedia mais os signatários, a concessão de uma área de 20 000 hectares de terreno ao longo da linha, obrigando-se a dar começo às obras no prazo de dezoito meses, contados da data da assinatura do contrato.

Seguiu-se volumosa troca de correspondência entre os signatários e a Secretaria geral e numa delas, datada de 24 de Novembro de 1906, o Ministro da Marinha e Ultramar informava-os de que o Governo de Sua majestade estaria disposto a fazer, de facto, a concessão de um caminho de ferro eléctrico de Lourenço Marques para Inhambane, nos termos do decreto de 27 de Novembro de 1902, «desde que tenha a convicção que ela se pretende bona fide e que se mostre que os futuros concessionários dispõem de necessários recursos para essa empresa, ou contem com apoio de quem deles disponha».

Numa outra carta datada de 7 de Dezembro de 1907, o Ministro fazia saber ao requerente Álvaro Amorim Borges, que as «condições de concessão» deveriam ser discutidas com o proposto concessionário e que a concessão em sí ficava dependente das garantias oferecidas pelas firmas ou pessoas, que a pedirem.

O Governo mantinha uma atitude de prudência em não passar para as mãos de qualquer peticionário menos escrupuloso um empreendimento de tamanha envergadura. Acautelava-se contra a febre das concessões, que estava na origem de muitos males.

Entretanto, para satisfazer os naturais anseios da população de Inhambane, o Governo informava a Câmara municipal que iam iniciar-se os estudos do caminho de ferro, ligando Inhambane a Inharrime, o que causava natural regozijo, conforme se lê da acta da sessão camarária de 30 de Outubro de 1907.

Por sua vez os pretendentes à concessão não desanimam, e, em requerimento de 24 de Março de 1908, John Makenna, John Askew e Álvaro Amorim Borges, mencionando que tinham a «promessa de concessão de uma linha eléctrica ou a vapor, de Lourenço Marques a Inhambane, via Marracuene, Manhiça, Magude, Xai-Xai, Inharrime e Inhambane, nas condições do decreto de 27 de Novembro de 1902», declaravam que lutavam com dificuldades para poderem conseguir a formação de uma companhia, pela razão de não terem nunhum documento oficial assegurando-lhes a concessão.

A Câmara Municipal, entretanto, insiste junto do Governo Central para que a obra se faça. Telegrafa-se a El-Rei D. Carlos, em Setembro de 1908, em nome da população de Inhambane, pedindo ao soberano para que fosse dada autorização imediata à construção da linha férrea. A esta diligência responde o Ministro da Marinha e Ultramar dizendo que a autorização seria concedida «assim que fosse recebido o projecto do caminho de ferro».

Entretanto, colonos e alguns que empregavam nas suas plantações avultados capitais, só o faziam contando com a construção de um caminho de ferro, cuja falta se foi fazendo sentir cada vez mais.

Não se deixou ficar, porém, inactivo o engenheiro Costa Serrão, pois tinha ideias próprias sobre o assunto, e com a data de 24 de Outubro, submeteu um estudo seu ao Governo.

O engenheiro Alfredo Azevedo opinava que se deveria prolongar o caminho de ferro de Manjacaze para Oeste em direcção do Chibuto e para Leste em direcção ao curso superior do Inharrime até Jinabai, ficando deste modo traçada a linha geral Mocuba/Magude/Inharrime/Inhambane.

O comandante João Belo, então presidente da comissão administrativa do Caminho de Ferro de Gaza, concordando com o traçado até Magude opinava que, daí para diante, deveria a linha seguir ao Xai-Xai directamente via Macia, então sede da circunscrição do Bilene. No Xai-Xai - pensava João Belo, tendo o seu entroncamento natural com o troço Xai-Xai/Manjacaze, far-se-ia o prolongamento até Chicomo, onde iria encontrar o caminho de ferro de Inhambane.

Entretanto, executara-se em 1907, por meio de empreitada, o estudo do caminho de ferro de Inharrime e foi elaborado pela inspecção de Obras Públicas o projecto respectivo, orçamento e memória descritiva, segundo as linhas gerais estudadas por Costa Serrão. Ao mesmo tempo, em Lourenço marques realizava-se o concurso público para o fornecimento de carris destinados à sua construção.

O arranque inicial para a execução da obra foi dado por ordem ministerial de 27 de Novembro de 1909, ao tempo do Governador geral Freire de Andrade, que não perdeu tempo em promover a primeira remessa de material ferroviário para Inhambane. Pouco depois, a 15 de Setembro de 1910, publicava aquele Governador a portaria nº. 746 estabelecendo normas de construção e exploração da via e criando a comissão administrativa do caminho de Ferro de Inhambane, presidida pelo respectivo governador do distrito.

Iniciou-se, assim, a construção desse caminho de ferro no troço Mutamba/Inharrime, melhoramento que se ficou devendo ao entusiamo de Freire de Andrade pelos assuntos ferroviários. Pouco tempo depois, a República foi proclamada. Houve mudanças dos comandos governativos e José Cabral foi nomeado governador do distrito de Inhambane.

Também o novo governador se interessou a fundo por esse caminho de ferro de penetração. No seu relatório de 1910/11 apresentava José Cabral a conveniência de se completar o caminho de ferro com o troço Mutamba/Inhambane. Pedia ainda a construção de uma ponte-cais, «como complemento do caminho de ferro e para que as cargas e descargas não se continuassem fazendo à cabeça do preto e por meio de lanchas como hoje sucede».

Finalmente, o grande interesse do governador do distrito, então capitão José Cabral, por este melhoramento, e a constante dedicação do pessoal ferroviário, acabou por triunfar.

Mais tarde, foi aberto à exploração o caminho de ferro de Xai-Xai a Manjacaze e, por portaria de 13 de Maio de 1916, foi aberto à exploração definitiva o segundo troço além Manjacaze, na extensão de 38 quilómetros. Mas a grande rede ferroviária do sul sonhada por João Belo, nunca se fez, e o caminho de ferro de Inhambane ficou reduzido ao troço Inhambane/Inharrime.

O Governo da Província, em 1917, mandou fazer o plano de ligação dos três caminhos de ferro, ao sul do Save, conforme portaria nº. 706, publicada no Boletim oficial nº. 51, de 23 de Dezembro desse ano, e manteve numa só autoridade a administração destes caminhos de ferro e portos. Esta organização deveria entrar em vigor em 1 de Janeiro de 1918, e ordenava que fossem tomadas todas as medidas necessárias para a execução imediata da portaria. Ficaram naquela altura as redes ferroviárias ao sul do Save a constituir três divisões de exploração, sob uma única direcção, pela seguinte ordem:

1ª. Divisão - a de Lourenço Marques
2ª. Divisão - a de Gaza
3ª. Divisão - a de Inhambane.


Mas levantaram-se imediatamente sérias rivalidades, de modo especial entre Inhambane e João Belo, e ainda, porque Inhambane não se conformou com a sua subordinação à rede de Lourenço Marques. Deste modo, essa nova organização pouco tempo durou, pois em resultado da sua insatisfação, a rede de Inhambane voltou a recuperar a sua autonomia como Direcção Distrital independente até finais de 1931.

O desenvolvimento dos distritos de Inhambane e Gaza nos anos que se seguiram, veio a acentuar a necessidade cada vez mais premente da grande rede ferroviária do Sul, tão calorosamente defendida pelo comandante João Belo, apesar de o problema ter tomado um aspecto mais difícil pela exiguidade das receitas das circunscrições e pelas grandes dificuldades que a Natureza opunha à sua solução. Mais tarde veio o problema complicar-se pela construção da Linha de Xinavane - pois, esclarece Álvaro de Castro, Magude, servido já, entendeu que não lhe merecia a pena concorrer para um melhoramento, que deixara de o ser em virtude da ligação que já tinha pela via férrea.

Os melhores entusiasmos arrefeceram, assim que rebentou, em Setembro de 1939, a Segunda Guerra Mundial, mas não se deixou esmorecer o Inspector de exploração, Henrique António Maurício que, debruçando-se sobre o assunto, em profundidade, como ninguém antes dele o fizera, apresentou à Direcção dos Serviços, em Lourenço Marques, com a data de 14 de Outubro de 1914, um bem elaborado estudo, fundamentado nas opiniões dos próprios antigos residentes do distrito, que ele pessoalmente recolheu.

sábado, 24 de agosto de 2013

Quando os Poetas Dialogam

DO BLOG "Navegações nas Fronteiras do Pensamento", de José de Sousa Miguel Lopes, em
http://navegacoesnasfronteirasdopensamento.blogspot.com.br/2013/08/quando-os-poetas-dialogam.html

«Esta postagem tem uma história. Num e-mail enviado à Cristina Vicente (1), amiga de longa data, coloquei, sem qualquer tipo de comentário, um poema do Manoel de Barros, um de meus poetas brasileiros preferidos. Estava longe de imaginar que a reação de minha amiga a este poema, fosse... um outro poema. “Ouçamos” primeiro o poema de Barros, mote que inspirou a digressão dialógica de Maria Machamba (2). É a partir desse poema, na inquietude da sua íntima condição, que a autora vai desvelando nos seus versos o silêncio desabitado, buscando uma condição de sujeito capaz de devanear, sonhar, produzir sentidos num sujeito ao qual, na fissura entre a realidade e a imaginação, só lhe resta o sussurro e a fuga.

José de Sousa Miguel Lopes



Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas
mais que a dos mísseis.
Tenho em mim
esse atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância
de ser feliz por isso.
Meu quintal
É maior do que o mundo.
Manoel de Barros

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Prezo amigos mais que insetos
Estórias mais que autores.
Os jardins, as árvores ainda mais que os livros. 
Passarinhos, gatos, cães 
Certamente mais que todos os insetos. 
Mas sim, tal como o Manoel de Barros 
Também eu prefiro os insetos aos aviões.
 
Sou feliz com a música
Mas não apenas, no meu quintal
Azeitonas, pão quentinho, chocolate, morangos, ameixas
Ai, que nem sei se não os prezo mais que à astronomia, pintura, política, biologia, medicina
Tal é a abundância de matéria, de saber.
 
Amo a terra, toco-a, planto-a
Congemino o seu germinar na magia das coisas.
E a brisa quente e suave mais que o vento.
Mais que isso, silêncio
Porque vou confidenciar, no meu jardim...
 
Prezo a vida, mais que a morte
A morte mais que a tortura.
O Homem, mais que a Deus.
E só prezo alguns 
A ti também.
 
O adeus não prezo.
Prefiro o até sempre
Que é uma forma mais consciente
De ir e ficar ao mesmo tempo.
O adeus ou até sempre, têm uma ordem, que só mora no meu pensamento.
 
Prezo os homens mais que as fronteiras.
O horizonte que às vezes é maior que a janela
Como o conto ultrapassa a escrita
Ou o pensamento
Mais veloz que os sentidos.
 
Prezo tantas coisas mais que insetos.
Mas porque não hão-de ser os gafanhotos, ainda que canhotos,
mais prezados que a vida ou a morte, ou que o conto?
Ou as abelhas, vá, que sustêm todo o equilíbrio do mundo
Em cada flor que se abre e fruto que se forma.
Se os livros nem conseguem saltar de esguelha
E as estórias não vão além da memória.
 
Só os insetos, por pura discricionariedade, hão-de valer menos que os poetas.
E mais que os aviões.
Maria Machamba


(1) Cristina Vicente, nascida em Moçambique em 1971 e descolonizada para Portugal ainda na tenra infância, filha e trineta de professores, neta de emigrantes machambeiros, lendo precocemente, evidenciou cedo a escrita poética. Advogada, consultora jurídica em funções públicas, entre outros desempenhos, a escrita, contida, transformou-se por longo tempo em ferramenta oficinal, laborando cuidadosamente para que não lhe coscuvilhasse a alma.
Maria Machamba é um pseudónimo nascido de um diálogo imaginário entre esta cidadã europeia do século XXI, ativa e cosmopolita, e um inteligente e bem humorado lente e mestiço de cultura, aspirante agriot. No momento em que o griot a convence a escutar a sua escrita, e embora desconfie não haver nela sons, fogo ou essência de imbonda, Maria Machamba nasce depois de ter estado morta.
Com vivências familiares marcadas por uma ligação distante, não obstante intensa e lúcida, a um continente desconhecido, a autora, partindo do afeto profundo por baobás e num regresso às suas origens africanas, marca agora o tempo intimista do reencontro de amizades improváveis e da escrita, para uma viagem extraordinária entre continentes, e sujeitos, pelo mundo da ciência, da música, das artes, ou qualquer outro campo fértil da vida.
(2) Machamba - Terreno agrícola para produção familiar em Moçambique.